Verdade pode ser omitida na política às vezes, diz teólogo

O teólogo suíço Hans Küng disse hoje, em audiência pública na Câmara, que, apesar de a verdade ser um dos fundamentos da política, para os homens públicos é necessária uma ressalva: o direito ao sigilo pessoal e profissional. Por isso, esclareceu, “ninguém é obrigado a dizer toda a verdade a todo mundo o tempo todo”.


Na opinião do deputado Chico Alencar (Psol-RJ), no entanto, essa prerrogativa pode abrir brechas “para os mentirosos da política”. Küng reconheceu que não há princípio moral que não possa ser usurpado. “Mas também não podemos nos ater ao fanatismo da verdade.

O teólogo suíço Hans Küng disse hoje, em audiência pública na Câmara, que, apesar de a verdade ser um dos fundamentos da política, para os homens públicos é necessária uma ressalva: o direito ao sigilo pessoal e profissional. Por isso, esclareceu, “ninguém é obrigado a dizer toda a verdade a todo mundo o tempo todo”.


Na opinião do deputado Chico Alencar (Psol-RJ), no entanto, essa prerrogativa pode abrir brechas “para os mentirosos da política”. Küng reconheceu que não há princípio moral que não possa ser usurpado. “Mas também não podemos nos ater ao fanatismo da verdade. Para os governos, isso seria absolutamente irreal”, completou.


Hans Küng participou da audiência pública promovida pelas comissões de Direitos Humanos e Minorias; e de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, e o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, para debater o tema “Ética e Globalização”. O evento foi solicitado pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Luiz Couto (PT-PB).


Concílio Vaticano

Küng lecionou teologia na universidade alemã de Tübingen juntamente com o papa Bento 16, e ganhou projeção mundial ao participar do Concílio Vaticano II. Dirige a Fundação Ética Mundial desde 1995, ano de sua fundação. O teólogo tem 62 livros publicados, que tratam, além de teologia, de política internacional, economia, filosofia e ciências naturais.


Segundo Küng, os princípios definidos pelo InterAction Council a respeito de uma ética mundial podem contribuir para a reforma política no Brasil. “É importante haver regras muito claras para as eleições”, disse. Criado em 1983, o InterAction Council é uma organização internacional independente que integra estadistas que ocuparam os cargos mais importantes em seus países – como primeiros-ministros e presidentes da República. Os integrantes do conselho desenvolvem recomendações e soluções práticas para os problemas políticos, econômicos e sociais que atingem a humanidade.


Ética para excluídos

O deputado Nilson Mourão (PT-AC) ressaltou que “a atual geração é marcada por uma profunda contradição, que causa mal-estar”. Ao mesmo tempo em que domina novas tecnologias, que a fazem sentir-se “dona do mundo”, não consegue resolver os problemas mais elementares da existência humana, como a fome e o trabalho. Diante disso, “que ética é possível para os excluídos?”, questionou. O deputado Carlos Abicalil (PT-MT) também lembrou o déficit histórico do Brasil no atendimento aos direitos humanos e sociais.


Na opinião de Hans Küng, as dificuldades enfrentadas hoje no País, apesar de graves, são muito menores que as vividas na Europa do pós Segunda Guerra, quando foi tudo destruído. “Nessa época, os Estados Unidos deram um exemplo único de como é possível enfrentar essa situação ao investir centenas de milhões de dólares na reconstrução do continente”, ressaltou.


Princípios fundamentais

O teólogo explicou que a ética global baseia-se em dois princípios fundamentais: a reciprocidade e a humanidade. Segundo ele, a reciprocidade já estava presente na regra de ouro de Confúcio, 500 anos a.C.: não faça ao outro o que não quer que façam a si mesmo. A humanidade também estava presente nas religiões chinesas e prega que cada ser deve ser tratado como especial.


A base desses princípios, explicou Küng, são quatro imperativos básicos (que também estariam presentes no budismo, judaísmo, cristianismo e islamismo):

1. não mentir, principalmente as grandes mentiras que têm conseqüências sociais;

2. não matar, principalmente em relação a genocídios em massa;

3. não roubar, aplica-se, principalmente, a grandes centros financeiros que causam prejuízos a milhões de pessoas;

4. respeitar a igualdade entre homens e mulheres. Segundo Küng, por tratar da sexualidade, esse é o principal problema para as religiões.


Na opinião do teólogo suíço, para que esses princípios se realizem é necessário uma vontade ética. Por isso, segundo ele, é tão importante o papel das religiões, que devem motivar as pessoas a desenvolver esses comportamentos.


Agência Câmara, 25 de outubro de 2007.