Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
A imprensa noticiou que a Secretaria da Receita Federal iria criar um serviço de acompanhamento especial para os cinco mil maiores contribuintes do imposto de renda.
Muitos contribuintes entenderam que seria uma espécie do programa de integração Fisco-Contribuinte, criado na gestão do Ministro Delfim Netto, da pasta da Fazenda, na década de 1960, se bem que tal programa se destinou, como mais apropriado, a todos os contribuintes e não apenas aos maiores.
Tratar-se-ia, agora
Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
A imprensa noticiou que a Secretaria da Receita Federal iria criar um serviço de acompanhamento especial para os cinco mil maiores contribuintes do imposto de renda.
Muitos contribuintes entenderam que seria uma espécie do programa de integração Fisco-Contribuinte, criado na gestão do Ministro Delfim Netto, da pasta da Fazenda, na década de 1960, se bem que tal programa se destinou, como mais apropriado, a todos os contribuintes e não apenas aos maiores.
Tratar-se-ia, agora, de criar, nas Delegacias da Receita, uma espécie de “sala VIP”, com ar condicionado, água gelada e cafezinho, na qual o grande contribuinte pudesse merecer um atendimento especial, para orientá-lo quanto ao cumprimento de seus deveres fiscais, com obediência às leis tributárias, de modo a evitar não só falhas e omissões nas declarações de rendimentos e bens, como também as práticas denominadas por “evasão fiscal”. Tal medida, constituir-se-ia em fecho de ouro para a Receita Federal, no atual governo, e uma contribuição para a melhoria da arrecadação no governo da Presidenta Dilma Roussef.
Todavia, com a publicação da Portaria nº RFB 2.356, de 14 de dezembro, os contribuintes tomaram conhecimento dos verdadeiros objetivos da nova medida. Trata-se, ao contrário do que se esperava, de um serviço destinado a conceber meios de verdadeira “tortura fiscal” dos grandes contribuintes do imposto de renda, aqueles que respondem por expressiva parcela da receita desse tributo (78%).
A portaria declara, textualmente, tratar-se do “acompanhamento econômico-tributário diferenciado de pessoas jurídicas e de pessoas físicas”. Para esse fim, o novo Serviço “deverá utilizar dados e informações” não só “disponíveis nos sistemas informatizados da RFB”, mas também os “coletados em fontes externas”, não se definindo quais seriam tais fontes, nem se esclarecendo o alcance da expressão “externas”, o que pode significar a violação da intimidade e da vida privada, garantidas pela Constituição (art. 5º, X).
Segundo a portaria, o novo serviço “deverá levar em conta” o “comportamento” do contribuinte “em relação aos tributos administrados pela RFB”. E caberá a uma Coordenação Especial organizar a lista das pessoas físicas e jurídicas a serem “acompanhadas”, editando, para isso, um “ato interno”, possivelmente secreto. A Receita divulgou, no entanto, que 5.140 pessoas físicas e 12.153 pessoas jurídicas foram enquadradas como “maiores contribuintes”.
As pessoas físicas e jurídicas objeto do tratamento confessadamente “diferenciado”, serão acompanhados por “Equipes de Trabalho” – EQMAC (por que “EQMAC”?), cujos integrantes, entre outras prerrogativas, terão as de “contatar os contribuintes”, com vistas a “tratar de assuntos no interesse do acompanhamento econômico-tributário diferenciado”. Ora, é surpreendente que um ato normativo, sem base legal expressa, atribua tais poderes a um funcionário fiscal, ou seja, uma espécie de estímulo à prática da corrupção ativa ou passiva, diante da evidente situação de fraqueza e pavor do contribuinte “contatado”.
É inacreditável que tudo isso seja feito por simples portaria, com total violação do princípio constitucional da igualdade, tanto a de todos os cidadãos perante a lei, inclusive, é claro, a lei tributária, “sem distinção de qualquer natureza” (art. 5º, caput), como a igualdade entre os contribuintes em geral (art. 150, II).
É claro que, diante da comprovação da hipótese de sonegação fiscal ou de evasão fiscal ilegal ou, mesmo, de inadimplência fiscal, o Fisco pode e tem o dever de instaurar o competente procedimento fiscal e aplicar as penalidades previstas em lei. Como também pode e deve dispensar tratamento enérgico a tais sonegadores, como aos grandes devedores do Fisco.
O que não se pode admitir, no entanto, é submeter uma expressiva parcela dos contribuintes do imposto de renda – os que sejam considerados “grandes contribuintes” – a um tratamento desigual, vedado pela Constituição e, pior do que isso, a uma situação de constante ameaça e constrangimento, como se todos fossem potenciais sonegadores.
Certamente, o Presidente Lula e a Presidenta Dilma Roussef não foram previamente informados sobre o ato inconstitucional, ilegal, inconveniente e inoportuno da Receita Federal.
Publicado no Jornal do Commercio de 21/01/2011